Hoje dia 1 de outubro fui embora de São Luís.
Chorei de manhã, chorei de tarde. Chorei porque tudo é sentimental pra mim, antes de ser qualquer forma de trabalho.
Durante dois meses, deixei a passividade e a lentidão fazer o roteiro. E ficou tudo muito emaranhado.
Chegar no Maranhão foi um soco. Nunca tinha me sentido tão estrangeira no Brasil. Tudo o que conhecia até agora nao servia mais, até a própria lingua. As vezes, « falar o português tão bem » não adianta, porque lingua é muito mais que idioma.
Eu não tinha noção da opulência de cultura e de arte que se faz aqui. E que bom que não se sabe ! Entrei numa terra de festejos tradições contemporâneas, cultura de colectividade e não só de indivíduos, de alimentos frescos, de vento, de igarapés, de tambores, de reggae, de quilombos, de casa de farinha, de manguezais e de encantados. Um dos estados mais pobres do pais. Minha definição de cultura foi atualizada real na porrada. Revisitei o lugar que ocupa a arte contemporânea e que então ocupo, mesmo que esteja sempre questionando esse lugar. Dessa vez foi mais fundo, perdi o chão, fiquei dentro de casa na anxiedade, as vezes não conseguia mais comer, estava ingerindo tanta coisa que nada mais podia entrar na minha barriga. O que chamamos de arte é uma linguagem entre muitas outras. E as vezes as outras são mais antigas, e enraizadas na saúde. Tem boi de 100 anos, como disse Ligia.
E não tem foto que traduza.
O avião está decolando e choro porque não sei quando vou rever essas pessoas e sentir o que eu senti. No meu cabelo ainda tem sal e areia de São Luís, pois não deu tempo de lavar. Eu vou jogar esse sal no mar do Rio.
Durante esse tempo, teci uma rede de vocabulários novos para mim que estou reunindo num glossário. Todos foram ensinados durante os encontros que eu fiz aqui: Gabriel, Rafael, Yuri, Ruli, Lygia, Rogério, PP, Thadeu, e amores efêmeros de uma noite que não vou expor aqui. Outros vem de conversas a distância com amigos na Suíça e em São Paulo. E as vezes as palavras vem de um pagode, de um funk ou de uma pisadinha. As definições que eu guardei dessas palavras são as espontaneas que eu recebi dessas pessoas.
Gosto de palavras novas porque elas ainda não estão cercadas de sentido, ainda estão nebulosas, cheias de possibilidades. Repito elas e aos poucos reparo elas nas falas das pessoas, em outros contextos. Até elas ficarem familiares e dar para eu usar. As palavras e as pessoas estão indissociaveis agora.
Yuri hoje disse uma das coisas mais lindas. Valentina gosta de povo. Amigo, acho que você também. Ontem Gabriel disse outra: aqui as pessoas estão sempre passando.
Obrigada ao @chãoslz, e então @samantha @thadeu e @gabriel que me acolheram durante um mês na Rua do Giz, obrigada @casadosereio e @yuri por me levar em Alcântara e abrir as portas dos seus saberes e duas redes de amigos.
Obrigada amigues, por me accolher tão bem, por me abrir as portas, por compartilhar comigo.
Imagens de mangues
Alcântara